Alguns temas, como autolesão e suicídio, ainda são delicados nas conversas entre pais e filhos, principalmente pela falta de informação e preparo para explorar sentimentos relacionados a essa situação. Segundo dados do Ministério da Saúde, metade de todas as doenças mentais começam aos 14 anos, e a maioria dos casos não é percebida. O suicídio já é a segunda principal causa de morte entre jovens de 15 a 29 anos e depressão e ansiedade já são consideradas as doenças desse século. Por isso, é muito importante estar atento ao comportamento dos jovens e adolescentes e saber identificar os sinais que indicam que eles estão precisando de ajuda.
Existem inúmeras crianças e adolescentes que dão sinais de sofrimento e desregulação emocional que podem levar a comportamentos autolesivos e ideação suicida, no entanto,a maioria dos pais não percebem esses sinais. A falta de tempo, de convivência e um olhar mais atento às emoções e comportamento dos filhos tem sido negligenciada atualmente, muitas vezes, também em virtude da correria no dia a dia, o foco extremo nas redes sociais e conversas por aplicativos de celular, acaba não proporcionando uma convivência de qualidade com os filhos.
“Identificar sinais de sofrimento podem salvar vidas, o primeiro sinal de uma criança em sofrimento pode ser apresentado através da dificuldade na escola, nas queixas de aprendizado e também comportamento escolar. Caso não se perceba sinais claros de sofrimento na infância a tendência é que piorem a cada dia levando a forte desregulação emocional, onde o adolescente tem dificuldade em tolerar o mal estar e principalmente a frustração, regulando então de forma inadequada que trazem grandes prejuízos'” alerta a psicóloga Talita Padovan.
Como esse tema tem ganhado destaque na internet, muitos pais podem associar os comportamentos autolesivos aos ‘modismos’. Os jovens realizam comportamentos autolesivos (casis) em momentos de solidão, dor, angústia, sofrimento e muita tensão interna, sentimentos com os quais ainda não conseguem enfrentar. Esses atos são vistos como tentativas de regular as emoções e ter um alívio imediato, é troca de uma dor emocional por uma física, a física vai doer e aliviar a interna, porém a dor física é imediata e passa a dor emocional e permanente, o que faz com que o paciente entre em um looping de autolesões.
Promovida pela Fiocruz, a pesquisa ‘Violência autoprovocada na infância e na adolescência‘ identificou 15.702 notificações de atendimento ao comportamento suicida entre adolescentes nos serviços de saúde, predominando o grupo etário de 15-19 anos (76,4%), do sexo feminino (71,6%), e raça/cor da pele branca (58,3%), no período de 2011 a 2014.
O fenômeno de suicídio na infância e adolescência não é algo recente, apesar do aumento nos casos desde 2016. Há pelo menos duas décadas, o Brasil vem apresentando uma variação para cima na média de casos. Durante muitos anos não se falou sobre o tema por medo de estimular a prática, mas tem-se entendido cada vez mais que é preciso abordar o assunto com responsabilidade, sobretudo porque esta não é uma questão individual, mas coletiva.
No contexto da pandemia, a ausência de convívio presencial na escola também privou, sobretudo os adolescentes, de lidar com um espaço de conflitos. Além da saúde mental afetada pelo tempo de reclusão, eles deixaram de aprender a lidar com dinâmicas de discordâncias e embates que emergem no ambiente escolar, ou seja, “fomos colocados à força para fora de nossas vidas reais. Agora, nosso esforço é cuidar fortemente da saúde mental de nossas famílias, para que dias melhores sejam vividos.”, pontua Talita Padovan.
Em vista disso, deve-se considerar o suicídio como uma resposta de dor e sofrimento onde a única solução encontrada pelo índiviuo para cessar a dor foi a morte, a ideação suícida não tem como objetivo tirar a vida e sim acabar com o desespero causado pela dor emocional, “Deixando bem claro que estamos falando de sofrimento psíquico grave”. Explica a especialista Talita Padovan.
O que mais ocorre no meio infanto juvenil é o bullying nas escolas, complexo de inferioridade, abuso sexual, solidão, conflitos emocionais e familiares que geram problemas psiquiátricos, como, depressão e ansiedade, levando-os a manifestar comportamentos diferentes dos demais, como isolamento, perda de interesse no entorno, alterações do sono, apetite e desempenho escolar.
“É preciso compreender que não existe uma única causa para que o adolescente passe por esse sofrimento, os fatores biológicos têm um papel primário que não deve ser desconsiderado, o ambiente invalidante (que invalida o sentir ou fazer do indivíduo) que é constituído pela família, escola, amigos, cuidadores, não devem ser desconsiderados. É importante dizer que ambiente invalidante muitas vezes não acontece de forma intencional. Um exemplo interessante que posso dar é imaginar que um adolescente fala aos seus cuidadores que não está se sentindo bem, mas como está sem febre é contestado ou até chamado de mentiroso, ou preguiçoso, estando ele se sentindo mal, isso é um ambiente invalidante que não está considerando o fato desse adolescente de fato estar com mal estar”, enfatiza a especialista Talita Padovan.
A Psicóloga Talita Padovan tem atendido esses pacientes e obtido resultados positivos com a DBT (Terapia Comportamental Dialética), uma terapia de primeira linha estruturada para atender pessoas com alta desregulação emocional, comportamentos autolesivos e condutas suicidas, características do TPB (Transtorno de personalidade Borderline). A terapia Comportamental Dialética é considerada a abordagem mais efetiva para tratamento de pacientes com desregulação emocional intensa, comportamentos autolesivos e ideação suicida. Na terapia comportamental dialética trabalha-se a regulação emocional, a efetividade interpessoal, a tolerância ao mal-estar, trilhando o caminho do meio e o mindfulness.
A DBT também tem se mostrado eficaz no tratamento de outros transtornos. Entre eles, transtorno de humor bipolar, transtorno alimentar, por uso de substâncias e outras adições, transtorno de estresse pós-traumático (TEPT), depressão e TDAH (Transtorno de Déficit de Atenção e Hiperatividade).
“O objetivo principal da DBT é que o paciente alcance capacidades básicas, aumente a segurança, reduza o descontrole comportamental, aumente a experiência emocional não angustiante, reduza o estresse traumático, aumente o auto respeito, alcance objetivos individuais abordando problemas normais da vida e assim encontrando uma vida valiosa e que vale a pena ser vivida. Explica a especialista Talita Padovan.
Crianças e Adolescentes que apresentam autolesão e ideação suicida com sintomas de problemas psiquiátricos devem ter um suporte familiar adequado, a partir de um acolhimento afetivo e sem julgamentos. Em seguida, deve-se procurar ajuda profissional para iniciar o tratamento terapêutico correto com um psicólogo na intenção de controlar os sintomas e evitando assim novas tentativas contra a vida e encontrando uma vida que vale a pena ser vivida.