O Rio Negro atingiu na segunda-feira, 16 de outubro, o nível mais baixo já registrado na história, superando a seca de 2010, de acordo com dados do Porto de Manaus. Os efeitos da estiagem severa são sentidos pelas comunidades no entorno da capital amazonense. Santa Helena do Inglês e Saracá, polos vibrantes do turismo de base comunitária na região, enfrentam dificuldade de acesso a itens básicos, como alimentos e água potável. No lugar dos típicos barcos, tratores estão sendo usados para o transporte de alimentos, em um trajeto de 20 minutos ou de quase uma hora, a pé no sol escaldante.
Nessas comunidades ribeirinhas, localizadas na Reserva de Desenvolvimento Sustentável (RDS) do Rio Negro, distante aproximadamente 1h30 de Manaus, outro fator tem piorado a qualidade de vida dos moradores: a poluição por meio da fumaça dos incêndios florestais que têm aumentado nesta temporada.
“Acho que essa seca tá pior que a de 2010, porque tá mais difícil para sair e chegar nas comunidades. E naquela época não tinha fumaça”.
afirma Sebastião Brito, presidente comunitário da Comunidade Saracá
Pousada comunitária fecha as portas
Os efeitos severos da seca também são sentidos nas fontes de renda dessas comunidades, que há mais de uma década trabalham uma alternativa econômica sustentável: o turismo de base comunitária. Em Santa Helena do Inglês, a pousada Vista do Rio Negro fechou as portas para os próximos dois meses pela falta de condições de manter a logística e estrutura para receber novos turistas durante a estiagem.
“A gente teve que desmarcar reservas e devolver dinheiro. Eu nunca tinha visto uma seca tão forte assim”, conta a gestora da pousada, Adriana de Siqueira, que lamenta o impacto no negócio, que aquece a economia local. “Algumas doações estão chegando (para a comunidade), mas a gente não queria viver de doação, a gente quer viver do nosso trabalho”.
A pousada, assim como outros empreendimentos turísticos na região do Rio Negro, foi implementada pela Fundação Amazônia Sustentável (FAS), com recursos do Fundo Amazônia. O objetivo da fundação é estimular o desenvolvimento do turismo protagonizado pelas pessoas que vivem nas comunidades, mantendo a floresta em pé e promovendo a prosperidade social.
Em Santa Helena do Inglês também funciona um projeto de energia solar. O sistema possui 132 painéis solares, 54 baterias de lítio e nove inversores híbridos, abastece as residências e propriedades privadas, igreja, centro comunitário, escola, fornece iluminação pública e atende as mais de 30 famílias que moram na comunidade, uma parceria da FAS com a empresa Unicoba, que agora se chama UCB, a maior empresa de armazenamento de energia do Brasil. Contudo, a seca do Rio Negro afeta igualmente a disponibilidade dos serviços estadual e municipal de saúde, e educação.
“Os médicos não estão mais visitando as comunidades e as aulas estão suspensas”, diz Adriana.
Aliança Amazônia Clima
Diante de uma temporada de estiagem sem precedentes, organizações da sociedade civil uniram-se na criação da Aliança Amazônia Clima. Facilitada pela FAS, a aliança está mobilizando doações de itens de primeira necessidade e destinando às comunidades mais afetadas pela seca.
Na última sexta-feira (13), a aliança realizou a entrega de cestas básicas na Reserva de Desenvolvimento Sustentável (RDS) do Rio Negro que beneficiaram mais de 150 pessoas nas comunidades Santa Helena do Inglês e Saracá.
“A Aliança Amazônia Clima atendeu o pedido da Associação da RDS do Rio Negro, que representa os moradores da região, e levou 38 cestas básicas, que foram distribuídas para as famílias e regiões mais necessitadas, mapeadas no território”, informa Valcleia Solidade, superintendente de Desenvolvimento Sustentável da FAS.
Valcleia conta que a missão de entrega dos donativos foi dificultada pelo baixo volume do Rio Negro e pela intensa camada de fumaça que cobriu o céu nos últimos dias em Manaus e região, mas o objetivo imediato foi alcançado.
“Tivemos muita dificuldade de chegar, mas chegamos e é importante dizer que a Aliança Amazônia Clima tem tudo para contribuir com o poder público e trazer um alento para as comunidades impactadas pela seca. É desafiador, é difícil, mas não é impossível, e esse é só o começo do trabalho que temos pela frente”, afirma a superintendente da FAS.