“Celulares, internet e as mídias sociais são uma droga potente”, afirma a professora da Universidade Stanford. A psiquiatra americana Anna Lembke, professora da Universidade Stanford e chefe de uma clínica especializada em dependência química, é uma das principais especialistas no assunto atualmente. Seu livro “Nação Dopamina”, publicado pela Editora Vestígio, é um best-seller mundial e destaca-se como um dos títulos mais vendidos de não ficção.
Lembke fala sobre o desafio da humanidade em viver na era moderna e as implicações sociais de um mundo que estimula a busca por prazeres artificiais. “Qualquer pessoa pode desenvolver um vício”, alerta.
Vivemos em uma era digital em constante evolução, onde a tecnologia desempenha um papel central em nossas vidas. No entanto, à medida que nos envolvemos cada vez mais com nossos dispositivos móveis e redes sociais, surge uma preocupação crescente sobre o impacto do uso excessivo de tecnologia em nosso comportamento e bem-estar. A terapeuta, especialista em vícios e comportamento humano, Madalena Feliciano, comenta sobre a relação entre a dopamina, o uso de celulares e redes sociais, o comportamento viciante e as consequências desse fenômeno na sociedade.
O papel da dopamina e a busca por recompensa
A dopamina é um neurotransmissor que desempenha um papel fundamental no sistema nervoso central. Ela está envolvida em diversos processos cognitivos e comportamentais, além de desempenhar um papel crucial no sistema de recompensa do cérebro.
Um dos principais sistemas em que a dopamina atua é o sistema de recompensa. Nesse sistema, a dopamina é liberada quando experienciamos algo prazeroso ou recompensador, como comer uma comida saborosa, receber elogios ou alcançar um objetivo. Essa liberação de dopamina cria uma sensação de prazer e motivação, incentivando o comportamento repetitivo para buscar essas recompensas.
O ciclo vicioso do uso de celular e redes sociais
As redes sociais e os aplicativos de celular foram projetados para estimular a liberação de dopamina, criando uma busca constante por recompensa e gratificação.
No contexto das redes sociais e da tecnologia, a dopamina também desempenha um papel importante. Quando recebemos uma notificação, como um novo e-mail, uma curtida ou um comentário em uma postagem nas redes sociais, isso pode estimular a liberação de dopamina em nosso cérebro. Essa sensação de gratificação e satisfação nos motiva a continuar usando as redes sociais e buscando mais interações e recompensas sociais.
Embora a dopamina seja essencial para o funcionamento normal do cérebro e para a motivação, o uso excessivo de certas atividades que estimulam a liberação de dopamina, como as redes sociais, pode levar a um comportamento viciante. A busca constante por recompensas nas redes sociais, muitas vezes impulsionada pela liberação de dopamina, pode levar a um uso compulsivo e a uma dependência prejudicial.
O comportamento humano e as redes sociais e as consequências do comportamento viciante
“As redes sociais desempenham um papel significativo na maneira como nos relacionamos uns com os outros. No entanto, o uso excessivo pode levar a um comportamento de busca de validação e comparação social constante, impactando negativamente nossa autoestima e bem-estar emocional. A preocupação com a quantidade de curtidas, seguidores e comentários pode levar à busca incessante por aprovação externa, afetando nossa saúde mental e relacionamentos reais”. Destaca Madalena Feliciano.
O comportamento viciante relacionado ao uso de celulares e redes sociais tem consequências significativas. O vício em tecnologia pode levar ao isolamento social, falta de sono adequado, queda no desempenho acadêmico e profissional, além de problemas de saúde mental, como ansiedade e depressão.
Impacto na vida em sociedade
O uso excessivo de tecnologia e o comportamento viciante associado a ela têm um impacto significativo em nossa vida em sociedade. A dependência de celulares e redes sociais pode resultar em várias consequências negativas que afetam tanto a interação pessoal quanto o tecido social como um todo.
Um dos principais efeitos adversos é a diminuição da interação face a face. À medida que as pessoas se envolvem cada vez mais com seus dispositivos eletrônicos e as redes sociais, as interações pessoais diretas podem ser negligenciadas. Isso pode levar ao isolamento social, à falta de conexões significativas e à redução da empatia e compreensão interpessoal. O contato físico e a comunicação não verbal também podem ser prejudicados, afetando a qualidade das relações e a capacidade de estabelecer conexões profundas com os outros.
O uso excessivo de tecnologia pode prejudicar a comunicação interpessoal. A dependência de mensagens de texto e comunicações online pode levar a uma diminuição das habilidades de expressão verbal e de escuta ativa. A comunicação digital muitas vezes carece de nuances e contexto, o que pode levar a mal-entendidos e dificuldades na interpretação das intenções e emoções dos outros. Isso pode afetar negativamente relacionamentos pessoais, trabalho em equipe e colaboração em diversos contextos sociais.
Além disso, a disseminação de notícias falsas e desinformação em plataformas online pode afetar negativamente o discurso público e a tomada de decisões informadas. As redes sociais se tornaram um terreno fértil para a propagação de notícias e informações enganosas. Isso pode gerar divisões e tensões sociais, prejudicando a confiança nas instituições, nas fontes de informação e no próprio tecido democrático. A polarização do discurso público, alimentada por bolhas de filtro e algoritmos de recomendação, pode dificultar o diálogo construtivo, a troca de ideias e a busca por consenso.
Conscientização e práticas saudáveis
Para mitigar os impactos negativos do uso excessivo de tecnologia, é fundamental adotar práticas saudáveis e conscientes no nosso dia a dia. Madalena Feliciano explica em maior detalhe algumas estratégias que podem ser adotadas:
1. Estabelecer limites de tempo: Definir limites claros para o uso diário de dispositivos eletrônicos pode ser uma maneira eficaz de controlar o tempo gasto em atividades digitais. Isso pode ser feito estabelecendo horários específicos para o uso de celulares, computadores e redes sociais, reservando períodos de tempo para atividades offline e interações pessoais.
2. Praticar a desconexão regularmente: É importante reservar momentos de desconexão digital em nossa rotina. Isso pode incluir períodos de tempo livre de dispositivos, como durante as refeições, antes de dormir ou ao acordar. A desconexão nos permite estar presentes no momento presente, desacelerar e reconectar-se com nós mesmos e com as pessoas ao nosso redor.
3. Cultivar relacionamentos reais: Investir em relacionamentos offline é crucial para contrabalançar o isolamento social causado pelo uso excessivo de tecnologia. Priorizar encontros presenciais, conversas face a face e atividades em grupo pode fortalecer os laços sociais, promover a empatia e melhorar a qualidade das interações interpessoais.
4. Investir em atividades offline: Encontrar prazer em atividades offline é essencial para equilibrar o tempo gasto em frente às telas. Isso pode incluir praticar exercícios físicos, envolver-se em hobbies criativos, ler livros, passar tempo ao ar livre, meditar ou simplesmente desfrutar de momentos de tranquilidade sem a interferência dos dispositivos eletrônicos.
Ao adotar essas práticas, podemos criar um equilíbrio saudável entre o mundo digital e o mundo real. É fundamental reconhecer os impactos do uso excessivo de tecnologia em nossa vida em sociedade e tomar medidas concretas para contrabalancear esses efeitos negativos.
“A conscientização sobre a relação entre a dopamina, o comportamento viciante e as consequências sociais é um passo fundamental para a promoção de um ambiente digital saudável. Ao compreendermos os mecanismos por trás do comportamento viciante, podemos tomar decisões mais informadas sobre o uso da tecnologia e buscar um equilíbrio que promova nosso bem-estar físico e mental”. Finaliza Madalena Feliciano.