A Rússia iniciou nesta quinta-feira (24) uma investigação sobre o acidente de avião que supostamente matou Yevgueni Prigozhin, líder do grupo paramilitar Wagner e grande rival do Kremlin desde a tentativa de motim do fim de junho, o que estimula as especulações sobre um eventual assassinato.
Nenhuma autoridade russa falou sobre o incidente. O presidente Vladimir Putin, que considera o fundador do grupo de mercenários um traidor, não fez qualquer menção ao tema em suas aparições públicas na quarta-feira e nesta quinta-feira.
A agência russa de transporte aéreo, Rossaviatsia, confirmou que Prigozhin estava a bordo do avião, que viajava entre Moscou e São Petersburgo, e que a aeronave caiu na quarta-feira à tarde na região de Tver, ao noroeste da capital.
Nenhuma pessoa a bordo (sete passageiros e três integrantes da tripulação) sobreviveu, mas as autoridades não anunciaram oficialmente a morte do líder paramilitar, pois os corpos ainda não foram identificados.
Entre as supostas vítimas fatais estaria Dmitri Utkin, o braço direito de Prigozhin. O ex-oficial do serviço de inteligência militar russos era o comandante de operações do Wagner.
Algumas informações também indicam a presença no voo de Valeri Chekalov, que segundo a imprensa russa era o diretor de logística do grupo.
O ministério russo de Situações de Emergências afirmou que a aeronave, que caiu perto da cidade de Kujenkino, era um jato particular Embraer Legacy.
Vídeos divulgados por vários canais do Telegram que afirmam ter vínculos com o grupo Wagner – dos quais a AFP não conseguiu comprovar a autenticidade – mostram os destroços de um avião, em chamas, em um campo. Outras imagens mostram a queda do jato.
Flores e caveiras
Nas imagens das equipes de resgate russas, destroços fumegantes são observados em uma clareira.
O Comitê de Inquérito russo abriu uma investigação por “violação das regras de segurança do transporte aéreo”, mas não mencionou nenhuma pista em particular.
Nas redes sociais, várias contas próximas ao grupo Wagner – que não tem endereço online oficial – mencionaram a hipótese de lançamento de um míssil terra-ar para explicar o incidente.
Durante a tentativa de motim em junho, que durou 24 horas, Putin não escondeu a irritação e acusou Prigozhin de “traição”.
Algumas pessoas citaram a possibilidade de uma encenação orquestrada pelo chefe do grupo de mercenários para desaparecer, mas Margarita Simonyan, editora-chefe da RT, canal estatal ligado a Putin, não deu crédito a esta hipótese.
“Pessoalmente, me inclino pela (pista) mais evidente”, comentou na plataforma X (ex-Twitter).
Na quarta-feira à noite, várias pessoas se reuniram diante da sede do grupo Wagner em São Petersburgo e depositaram cravos vermelhos, velas e símbolos do grupo, com uma caveira, na frente do prédio.
“Não temos palavras”, declarou à AFP um homem que escondeu o rosto e usava boné e suéter com o logotipo da organização. Ele pediu apoio a “Yevgeny Viktorovich (Prigozhin) e todos os nossos comandantes”.
Na Ucrânia, onde o grupo Wagner lutou durante muito tempo, o presidente Volodimir Zelensky comentou o acidente.
“O que é certo é que não temos nada a ver com esta situação. Acredito que todos sabem quem está envolvido”, afirmou Zelensky em uma referência velada à possível responsabilidade do Kremlin.
Um conselheiro da presidência ucraniana, Mikhailo Podolyak, observou que a morte de Prigozhin é um sinal de Putin às “elites russas antes das eleições (presidenciais) de 2024”.
Dúvidas razoáveis
Vários líderes mundiais sugeriram que a morte de Prigozhin pode ter sido planejada pelo Kremlin.
O presidente dos Estados Unidos, Joe Biden, afirmou: “Eu não sei exatamente o que aconteceu, mas não estou surpreso. Não há muita coisa que aconteça na Rússia que Putin não esteja por trás”.
O porta-voz do governo da França, Olivier Véran, afirmou que há “dúvidas razoáveis sobre as “condições” do acidente aéreo.
“Não é uma coincidência que todos os olhares estejam voltados para o Kremlin quando um ex-aliado de Putin, em desgraça, cai literal e subitamente do céu dois meses após uma rebelião”, declarou a chefe da diplomacia da Alemanha, Annalena Baerbock.
Em 24 de junho, Prigozhin liderou um motim contra o Estado-Maior russo e o ministro da Defesa, Serguei Shoigu, assumindo o controle de quartéis do sul da Rússia e iniciando uma marcha em direção a Moscou.
Mas a rebelião foi interrompida no mesmo dia, após um acordo que previa a viagem de Prigozhin para Belarus e a a adesão dos milicianos do grupo Wagner ao exército oficial russo.
Apesar do acordo, o fundador do grupo paramilitar Wagner continuou viajando para a Rússia e chegou a visitar o Kremlin.
Na segunda-feira, Prigozhin apareceu em um vídeo divulgado por grupos próximos ao Wagner, no qual afirmou que estava na África para tornar a “Rússia ainda maior”.
Fonte: AFP