Ele se chama Carlos Augusto de Assunção Pitanga Neto, mas se tornou conhecido nas redes sociais pelo apelido de Cacauzinho Neto, o garoto marombado de 12 anos capaz de levantar até 92 kg de peso, fazer 700 abdominais por dia e correr mais de 5 km, pelo menos seis vezes por semana.
“Com 8 anos, Cacauzinho já corria 10 km”, resume Carlos Augusto, o pai orgulhoso, também crossfiteiro, ao lado de um filho para lá de tímido.
O garoto começou a rotina marombeira junto com outras crianças, em 2021, quando se matriculou na academia Crossfit Oxente, em Salvador (BA), depois de fazer uma aula experimental e ter o melhor tempo do dia, superando inclusive os adultos.
“A gente o matriculou em dezembro (época das férias escolares). Aí, começou aquela rotina de treinos. Às vezes, eu mesmo não queria ir treinar, mas ele dizia: ‘Não, bora, bora, pai’. Foi aí que o professor disse: ‘Esse garoto tem potencial, não quero tê-lo mais com crianças'”, recorda o pai.
Hoje, Cacauzinho mantém a carga de exercícios de gente grande e uma alimentação regrada (não toma refrigerante e são oito ovos diariamente, por exemplo). A família garante que a criança não faz utilização de hormônios e os únicos suplementos alimentares são a creatina e o ômega-3.
A fama do menino ganhou outros ares depois do lançamento de um perfil nas redes sociais, com a exibição de fotos e vídeos com treinos diários e pesados. Hoje, ele tem 269 mil seguidores e pelo menos quatro patrocinadores fixos, grava cerca de 20 publicidades e mantém uma equipe de cinco profissionais.
“Ele tem nutricionista, fisioterapeuta, dentista, tem tudo em volta dele, né? Uma equipe multidisciplinar.”
E a rotina de criança?
Ao R7, a família garante que o foco do menino — que está no 7º ano — são os estudos e que, apesar da carga pesada de exercícios — pelo menos três vezes por dia —, ele também tem o período de lazer: joga futebol, vai à praia e ao shopping com outros amigos.
Atualmente, Cacauzinho participa de algumas competições e tem um objetivo: o de chegar ao Crossfit Games, uma espécie de campeonato mundial que será realizado nos Estados Unidos.
Questionado se gosta dessa rotina pesada, Cacauzinho diz: “Eu gosto de fazer tudo, menos de correr”.
Especialistas fazem ressalvas
Para Ana Escobar, médica pediatra e professora na Faculdade de Medicina da USP (Universidade de São Paulo), é preciso ter “bom senso” no momento da prática física.
“Ele está em plena puberdade, começando a liberar agora os hormônios, principalmente testosterona, que é o hormônio do homem e ajuda a dar uma hipertrofia muscular. Então, o que acontece em relação à saúde quando se começa a fazer esse excesso de exercício? A gente sempre diz que o segredo da vida é ter bom senso, e isso é verdade. Existe o que a gente chama de saúde física e saúde mental”, explica a especialista.
“A gente não recomenda via de regra que os adolescentes façam esse excesso de atividade física, seja ela aeróbica ou anaeróbica. Isso pode prejudicar um pouco todo o crescimento e desenvolvimento dele em relação à sua saúde mental, principalmente. Porque isso acaba virando uma necessidade de ele se mostrar fisicamente para todo mundo.”
Matheus Alves Alvares, coordenador de endocrinologia pediátrica do Sabará Hospital Infantil, em São Paulo, recomenda 60 minutos de atividades físicas por dia, predominantemente aeróbicas, e outras atividades (em que a criança salte, pule, nade, brinque) pelo menos três vezes por semana.
“Isso para que a criança fortaleça ossos, fortaleça músculos, mas usando principalmente o peso do próprio corpo. A partir do momento em que você coloca uma atividade com uma carga excessiva, além de você ter uma possível repercussão no crescimento futuro dessa criança, você também a expõe a maior risco de lesões.”
Segundo o especialista, existem estudos que mostram “que atividades físicas em períodos contínuos, maiores do que três horas por dia, podem trazer algum tipo de repercussão no crescimento”.
Já a nutricionista Carol Farias cita o alto crescimento dos índices de sobrepeso e obesidade na população dessa idade e afirma que o sedentarismo é um dos pontos mais influentes nessa nova realidade.
“É muito comum ouvirmos que a prática de exercícios de força, como a musculação, não é recomendável, mas isso provou ser um mito. Porém, ela deve ser realizada com supervisão muito próxima, e o ideal é que seja apenas com o peso do corpo da criança, sem realizar sobreposição de cargas.”
Os pais dizem que Cacauzinho é monitorado: ele começou o crossfit com 1,34 m de altura e hoje tem 1,47 m. Eram 33 kg no começo, e hoje, 38 kg. Segundo eles, o menino nunca sofreu uma lesão durante os exercícios.
O que diz a ONU
Documento elaborado pela OMS (Organização Mundial de Saúde) com diretrizes para a prática de atividades físicas diz que crianças e adolescentes, entre 5 e 17 anos, devem fazer pelo menos “60 minutos por dia de atividade física de moderada a vigorosa intensidade, ao longo da semana” e que “a maior parte dessa atividade física deve ser aeróbica”.
“Em crianças e adolescentes, a atividade física proporciona benefícios para os seguintes desfechos de saúde: melhora da aptidão física (aptidão cardiorrespiratória e muscular), saúde cardiometabólica (pressão arterial, dislipidemias, glicose e resistência à insulina), saúde óssea, cognição (desempenho acadêmico e função executiva), saúde mental (redução dos sintomas de depressão) e redução da adiposidade”, diz trecho do documento.