Tradicional empresa brasileira de produtos de limpeza, a Bombril enfrentou desafios financeiros significativos ao longo de sua história. Em 2003, a companhia entrou com um pedido de recuperação judicial devido a dificuldades financeiras decorrentes de tentativas malsucedidas de diversificação de seu portfólio, incluindo a entrada no setor de cosméticos. Esse processo foi concluído em 2006, mas a empresa continuou a enfrentar altos níveis de endividamento nos anos subsequentes.
Em 2015, a situação se agravou, com as dívidas da Bombril atingindo quase R$ 900 milhões, resultando na escassez de seus produtos nas prateleiras dos supermercados. Uma reestruturação significativa foi implementada em 2017, permitindo que a empresa registrasse lucro e retomasse parte de sua estabilidade financeira.
No entanto, a Bombril continuou a enfrentar desafios financeiros. Em 2023, a empresa contraiu um empréstimo de R$ 300 milhões para refinanciar parte de sua dívida, que na época era de R$ 401 milhões, com 77% desse montante vencendo em 12 meses. Esse movimento visava alongar o perfil da dívida e reduzir os custos financeiros.
Agora, em 2025, a Bombril entrou com um novo pedido de recuperação judicial devido a dívidas tributárias de R$ 2,3 bilhões. O processo foi registrado na 1ª Vara Regional Empresarial e de Conflitos Relacionados à Arbitragem. A decisão foi tomada em conjunto com outras empresas do Grupo Bombril devido a riscos financeiros elevados provenientes de contingências tributárias acumuladas nos últimos anos.
O principal motivo para a recuperação judicial são autuações da Receita Federal relacionadas à falta de recolhimento de tributos conhecidos por T-Bills, entre 1998 e 2001, período em que a empresa estava sob controle do grupo italiano Cragnotti & Partners. Mas afinal, o que são as T-Bills?
De acordo com Filipe Denki, especialista em Direito Empresarial e Recuperação Judicial, as T-Bills (Treasury Bills) são títulos da dívida pública emitidos pelo Tesouro dos Estados Unidos com prazos curtos de vencimento, geralmente variando entre algumas semanas e um ano. Diferente de outros títulos do governo americano, as T-Bills não pagam juros periódicos (cupons). “Elas são vendidas com um desconto sobre seu valor de face e, no vencimento, o investidor recebe o valor total. A diferença entre o preço de compra e o valor nominal recebido representa o rendimento do investidor”, explica.
Esses títulos são considerados investimentos de baixo risco, pois são garantidos pelo governo dos EUA e amplamente utilizados por investidores institucionais e individuais para proteger capital e manter liquidez. Empresas e bancos internacionais também adquirem T-Bills para diversificação de portfólio e gestão de caixa. “Mas as operações envolvendo T-Bills podem ter implicações fiscais, dependendo da jurisdição e da forma como os títulos são adquiridos e contabilizados”, alerta o especialista.
Denki explica que, como o pedido de recuperação judicial da Bombril está relacionado principalmente a dívidas tributárias decorrentes de autuações da Receita Federal sobre operações financeiras antigas (T-Bills entre 1998 e 2001), não há uma ligação direta entre esse decreto de Trump e a atual crise da empresa.
Detalhes da dívida da Bombril
O montante em discussão nos processos judiciais é estimado em aproximadamente R$ 2,3 bilhões, impactando diretamente a saúde financeira da companhia.
A decisão foi tomada após uma recente derrota judicial, que aumentou o risco de perda nesses processos. A administração da Bombril avaliou que essa ameaça comprometeria sua sustentabilidade financeira, tornando necessária a proteção de seu caixa e a renegociação de dívidas com fornecedores e financiadores.
O pedido de recuperação judicial tem como objetivo viabilizar a continuidade das operações da Bombril, minimizar impactos sobre credores, fornecedores e colaboradores e possibilitar um novo ciclo de crescimento. A empresa afirmou que continuará negociando parte de seu endividamento fora do processo de recuperação judicial, incluindo passivos fiscais.
A Bombril, que vinha apresentando resultados positivos nos últimos trimestres, espera que a recuperação judicial permita a manutenção de suas atividades e a retomada da estabilidade financeira. Uma Assembleia Geral Extraordinária será convocada para discutir os próximos passos da reestruturação da companhia.
“A recuperação judicial é um mecanismo jurídico previsto na Lei 11.101/2005 que permite a empresas em dificuldades financeiras renegociarem suas dívidas com credores, enquanto continuam operando. O objetivo é evitar a falência, permitindo que a companhia reestruture suas finanças e preserve empregos. O processo envolve a apresentação de um plano de recuperação, que será analisado pelos credores e pelo Judiciário. Se aprovado, a empresa ganha um prazo para cumprir suas obrigações dentro de um novo cronograma”, orienta Denki.
No caso da Bombril, após o deferimento do pedido de recuperação judicial, a empresa terá até 60 dias para apresentar seu plano de recuperação. “Esse plano deverá detalhar como pretende reorganizar suas dívidas, quais os prazos de pagamento e eventuais concessões que busca dos credores. Em seguida, os credores votarão a proposta em uma Assembleia Geral. Se aprovado, o plano será homologado pela Justiça e a empresa iniciará sua reestruturação conforme os termos acordados. O sucesso do processo dependerá da capacidade da Bombril de equilibrar suas finanças e retomar a confiança do mercado”, acrescenta.
“No caso da Bombril, que utiliza aço para a produção de lã de aço e outros produtos, esse tipo de medida pode aumentar seus custos de produção ao longo dos anos, prejudicando sua competitividade e contribuindo para seus desafios financeiros”, conclui Denki.