Uma ação conduzida pelo escritório Rücker Curi resultou no afastamento da súmula 616 do Superior Tribunal de Justiça (STJ), havendo conclusão de que o pagamento de indenização securitária não é devido quando o segurado ficou inadimplente por longo período de tempo antes da ocorrência do sinistro, apesar de não ter havido comunicação prévia da seguradora em relação à inadimplência. Na decisão, ocorrida no último mês de janeiro, foi caracterizada violação do princípio da boa-fé que rege as relações contratuais por parte do contratante do seguro. Mas, afinal, o que exatamente é este princípio?
Previsto no Código Civil Brasileiro – mais precisamente nos artigos 113, 187 e 422 – o princípio da boa-fé nas relações contratuais exige que as partes envolvidas atuem com lealdade, honestidade e cooperação mútua. Ele rege as condutas adotadas antes, durante e também depois da celebração de um contrato.
Existe a boa-fé subjetiva e a boa-fé objetiva. A primeira está ligada à crença sincera de que se está agindo de forma correta, sem qualquer intenção de gerar dano a outra parte. A segunda está relacionada à necessidade de agir conforme um padrão ético esperado, independentemente da intenção subjetiva da parte.
O princípio é importante na proteção dos contratantes e na limitação de abusos. Ele influencia a interpretação contratual, a responsabilidade civil e o equilíbrio das obrigações. Sua violação acontece quando uma das partes age de maneira desleal, abusiva ou contraditória, prejudicando a outra. Como exemplo, pode-se citar uma contradição de comportamento (venire contra factum proprium), abuso de direito (art. 187 do Código Civil), omissão ou retenção de informações relevantes (duty to inform) e quebra da confiança (duty to cooperate).
A violação, além de ferir a ética contratual, pode gerar consequências no âmbito jurídico, em proteção à parte lesada. Se ela comprometer a essência do contrato, pode resultar em nulidade ou rescisão do mesmo. Caso uma das partes tenha sofrido prejuízo direto, pode vir a receber indenização por danos materiais e morais. Além disso, quem agiu de má-fé pode perder o direito a benefícios e mesmo garantias contratuais.
No caso específico conduzido pelo Rücker Curi, o contrato, firmado no ano de 2016, previa pagamento de 58 parcelas de prêmios, tendo sido quitadas apenas oito até a ocorrência do sinistro, em 2019. A terceira turma do STJ avaliou a capacidade técnica do segurado (no caso, pessoa jurídica) e reconheceu a ocorrência de inadimplemento substancial por parte do mesmo.
*Izabela Rücker Curi é advogada, sócia fundadora do Rücker Curi – Advocacia e Consultoria Jurídica e da Smart Law, startup focada em soluções jurídicas personalizadas para o cliente corporativo. Atuante como conselheira de administração, certificada pelo IBGC.