A coordenadora de Manutenção da Visteon, Gisela Alcalá, é venezuelana e relata a sua experiência no Brasil. “Hoje trabalho na minha área, sou formada em engenharia industrial na Venezuela, com especialização em comércio internacional. Tenho mais de 20 anos de formada”, conta. © UNHCR/Paula Mariane
“Competência não tem nacionalidade”. Com essa afirmação, a proprietária da Sinapsy Psicologia e Consultoria Organizacional, Leuza Medeiros, reiterou a importância do acolhimento e da não discriminação ao estruturar uma equipe culturalmente diversa. Ela e outros atores do setor privado estiveram presentes no IV Fórum Hermanitos de Empregabilidade que teve como tema “Potencial local, impacto global: a inclusão de profissionais refugiados e migrantes, fortalecendo a economia e transformando o mercado”.
A edição contou com o apoio da Agência da ONU para Refugiados (ACNUR) e da Fundação Pan-Americana para o Desenvolvimento (PADF).
Na ocasião, Leuza também reforçou o papel do ser humano como figura central na promoção da inclusão e diversidade nos espaços de trabalho. “As pessoas são responsáveis pela sociedade que estamos construindo. A empresa não é inclusiva, é um aparelho, é um lugar. As pessoas são inclusivas. A inclusão vem das pessoas”, diz.
Sobre os desafios a serem superados, a diretora de Recursos Humanos do Grupo DB, Elane Medeiros, ressaltou que é preciso “elevar o nível de confiança na empresa”, respeitando as diferenças no ambiente de trabalho. Desse modo, os profissionais refugiados poderiam desempenhar um papel central na criação de soluções locais.
O diretor de Projetos do Hermanitos, Anderson Mattos, e a diretora do Sine Amazonas, Samantha Chíxaro, complementam que o diálogo é a base para avançar no campo da diversidade, criando um espaço para escuta ativa.
“[É preciso] ouvir com naturalidade para que possamos aprender”, afirma Anderson. “Ficamos preocupados em não deixar o outro desconfortável. A questão é conversar com a pessoa e entender como ela quer ser tratada”, complementa Samantha.
Histórias de vidas
A coordenadora de Manutenção da Visteon, Gisela Alcalá, é venezuelana e relata a sua experiência no Brasil. “Hoje trabalho na minha área, sou formada em engenharia industrial na Venezuela, com especialização em comércio internacional. Tenho mais de 20 anos de formada”, conta. “Lidero um time de 15 pessoas, são 14 homens e uma mulher. E, realmente, eu me sinto confortável para falar que me sinto em família”, conta.
Gisela parabenizou quem apoia a inserção laboral de pessoas refugiadas e migrantes. Além do sustento familiar, ela menciona outro fator muito importante nesse processo: voltar a sonhar. “Porque é isso que faz um emprego: [proporciona] saúde mental, tranquilidade, e novamente podemos sonhar em crescer em um novo país.”
Já a jovem aprendiz venezuelana Jensmar, do Grupo DB, relata que descobriu a sua paixão por Recursos Humanos enquanto participava do Jovens em Ação, programa que oferece capacitação profissional para jovens de 14 a 22 anos, visando a conquista do primeiro emprego.
Estabelecido em 2022, o projeto Jovens em Ação é conduzido pelo Hermanitos, em parceria com o ACNUR, o Ministério Público do Trabalho no Amazonas e em Roraima, a Secretaria de Inspeção do Trabalho (SIT), o Tribunal Regional do Trabalho da 11ª Região e a PADF.
“Eu tenho prazer de trabalhar com Recursos Humanos. Fiquei muito feliz de saber que o programa Jovens em Ação abriu uma nova turma de haitianos, e eu pude conhecer dois deles e recebi seus documentos [de candidatura]. Para mim, é um projeto que abre muitas portas”, destaca.
A jovem aprendiz venezuelana Jensmar, do Grupo DB, relata que descobriu a sua paixão por Recursos Humanos enquanto participava do Jovens em Ação, programa que oferece capacitação profissional para jovens de 14 a 22 anos, visando a conquista do primeiro emprego. © UNHCR/Paula Mariane
Progressão e promoção para pessoas refugiadas
O coordenador de diversidade e inclusão da Bemol, Scoty Diniz, avalia que a contratação de pessoas refugiadas “pode agregar uma perspectiva mais diversa para tomadas de decisões na empresa”.
Para ele, a integração socioeconômica de pessoas refugiadas pode fortalecer a coesão social, a resposta humanitária com sustentabilidade e a superação de desafios demográficos. “Queremos que essa pessoa tenha um plano de carreira, que isso seja feito de forma estruturada.”
A gerente de Recursos Humanos da Solar Coca-Cola, Luiza Mamede, conta que em 2024, a empresa chegou a contar com 89 profissionais refugiados e migrantes em diversas áreas, como administração, logística e comercial. “Entre os 89 contratados, temos também menores aprendizes. Além disso, começamos a progressão de carreira. Temos refugiados e migrantes que foram promovidos”, afirma.
A integração socioeconômica de pessoas refugiadas é benéfica para as comunidades de acolhida e também para os negócios locais. Para o diretor-presidente do Hermanitos, Tulio Silva, considerar os talentos destas pessoas é crucial. “Olhando para uma empresa que quer acessar mercados globais, o talento de pessoas refugiadas e migrantes faz a diferença. Esse profissional vai abraçar a oportunidade para poder fazer a diferença, demonstrando comprometimento com as suas funções”, aponta.
Aprendizado compartilhado, fortalecimento conjunto
Há mais de três anos, o ACNUR criou, junto ao Pacto Global da ONU no Brasil, o Fórum de Empresas com Refugiados, que conta com mais de 130 empresas e organizações empresariais associadas. Neste ano, foi lançado o primeiro monitoramento que apontou que 55 empresas, sendo seis organizações empresariais, são responsáveis por mais de 12 mil contratações de pessoas refugiadas no Brasil.
Esta é a primeira pesquisa aprofundada do gênero, conduzida ao longo de 2024, com respostas de 72 empresas e organizações. O monitoramento revelou que, dentre as 55 empresas respondentes que contratam pessoas refugiadas, 98% contratam em regime CLT, 50% contratam jovens em vagas de aprendiz e de estágio e 11% estão abertas a contratarem também como prestadores de serviço ou pessoa jurídica.
Após aderirem ao Fórum, as empresas tiveram um salto meio de 24% nas contratações de pessoas refugiadas, aponta o relatório.
O representante do ACNUR no Brasil, Davide Torzilli, enfatiza a importância de oferecer oportunidades de geração de renda e integração socioeconômica para aqueles que necessitam de proteção internacional. “As pessoas forçadas a se deslocar enfrentam dificuldades únicas no processo de integração local, sendo preciso incluir uma abordagem transversal para garantir que as intervenções cheguem aos grupos mais vulneráveis”, diz.
Para saber mais sobre iniciativas envolvendo o setor privado, acesse a plataforma Empresas com Refugiados, iniciativa estabelecida em 2021 e que conta com mais de 130 empresas e organizações parceiras.