Desde o início do ano, a Americanas vem passando por forte crise financeira que já soma mais de R$40 bilhões, frutos de um possível desvio que foi confirmado terça (13), pelo Comitê Independente que identificou um forte esquema de fraude contábil.
Envolvendo vários executivos da empresa, a fraude funcionava a partir da contratação de bônus junto à indústria e contratos fictícios de verba de propaganda cooperada, que inflaram as receitas e o lucro da empresa. Toda a fraude era ocultada do mercado e do próprio conselho de administração.
Segundo análise de Wagner Moraes, CEO da A&S Partners e especialista em varejo, para manter o respaldo financeiro e lastro contábil, o custo das operações era reduzido utilizando como contrapartida contas patrimoniais de passivos a ativos da companhia. “Operações financeiras foram contratadas sem as devidas aprovações internas e consideradas na geração de caixa. O montante levantado e divulgado soma R$21,7 bilhões. Foram diretamente impactadas as contas de fornecedores, através das operações de forfaiting, ativos foram super avaliados, bem como o seu patrimônio líquido”, destaca.
Wagner, um dos primeiros especialistas a implementar o sistema Forfait no varejo do Brasil, em meados de 1998, destaca também que a empresa que auditava a Lojas Americanas em 2023 era a PwC (Price Waterhouse Coopers), uma das quatro maiores empresas de consultoria e auditoria do mundo. “A PwC foi responsável por avaliar as demonstrações financeiras da varejista, que revelaram um rombo de R$20 bilhões causado por operações de “risco sacado” . A PwC aprovou as contas da Americanas sem ressalvas na última auditoria de 2021, período alvo das “inconsistências contábeis”. A atuação da empresa de auditoria e dos profissionais envolvidos foi alvo de investigações por parte da Comissão de Valores Mobiliários (CVM) e pelo Conselho Federal de Contabilidade (CFC)”.
O economista explica que o Forfait, também chamado de “Risco Sacado”, é uma operação financeira disponibilizada pelas Instituições Financeiras e uma prática realizada pelas empresas como modalidade para antecipação de recebíveis. “Essa operação é bastante comum entre empresas do setor de varejo e funciona da seguinte forma: uma empresa recebe os produtos de seu fornecedor ou a execução dos seus serviços de forma antecipada ao pagamento. Assim, o valor e as formas de pagamento são acordados entre as partes de forma prévia. O fornecedor realiza a emissão de uma fatura com um prazo a ser financiado por um banco ou instituição financeira autorizada a oferecer essa modalidade, ou seja, o banco credor do risco sacado. No entanto, o valor de venda não é considerado pelo fornecedor em sua contabilidade quando essa operação é feita. Da mesma forma, a empresa que está pagando de forma antecipada também não reconhece o valor de saída em seu passivo oneroso. Ao invés de considerar como “passivo oneroso”, a empresa coloca o valor do montante pago como passivo de fornecedores, ou seja, nas suas dívidas com fornecedores. Quando a empresa devedora capta recursos para pagar fornecedores antecipadamente, após o pagamento feito, é preciso baixar o saldo devedor da conta de fornecedores e registrar a dívida com o Banco que cedeu os recursos”.
Wagner pontua que um erro de ingerência era pouco provável e que a fraude já era esperada, “Embora seja importante adotar práticas cuidadosas e precisas na contabilização de qualquer transação financeira, inclusive do Forfait, erros ingênuos podem ocorrer. Alguns possíveis erros na contabilização do Forfait podem incluir: erros de registro, na taxa de desconto praticada, na conciliação, documentação de suporte, dentre outros. Para evitar erros ingênuos na sua contabilização, é recomendável seguir boas práticas contábeis, revisar cuidadosamente os documentos envolvidos, conciliar regularmente os registros contábeis com os extratos fornecidos pelo banco e, quando necessário, buscar a assistência de profissionais contábeis ou especialistas financeiros para garantir a precisão e a conformidade das operações contábeis relacionadas ao Forfait. Essa operação é bastante antiga e tradicional no país, sendo que as grandes empresas, bem como as auditorias, estão bastante acostumadas com o seu processo de contabilização. As chances de erros ingênuos são nulas, ou quase inexistentes”.
O economista ainda salienta que o posicionamento da Lojas Americanas em informar ao mercado é uma tentativa de minimizar o impacto negativo da revelação e de se distanciar dos responsáveis pela irregularidade. “No entanto, a empresa ainda terá que enfrentar as consequências legais, regulatórias e reputacionais da fraude, além de recuperar a confiança dos investidores, fornecedores e clientes. A empresa também terá que revisar seus processos internos de controle e auditoria, para evitar que novas fraudes ocorram no futuro”.