Fato relevante publicado esta semana dá conta de que sócios e administradores da Americanas cometerem fraudes e lançamentos indevidos da ordem de mais de R$ 20 bilhões. Os números são preliminares, não auditados, mas revelam um possível esquema para engordar as remunerações de seus executivos.
“Seis meses depois, a investigação conduzida pela própria empresa confirmou a fraude consubstanciada por lançamentos errôneos em seus balanços, com a conivência de seus administradores e assessores. Esta ‘pedalada contábil’ tinha por objetivo inflar os números da empresa, garantindo gordas remunerações a seus executivos”, avalia Fernando Canutto, advogado especializado em Direito Empresarial e sócio do Godke Advogados.
Segundo ele, não bastasse a fraude contábil, a contratação de empréstimos sem autorização devida “levanta a hipótese de conivência dos bancos parceiros que concederam os empréstimos, afinal, a lei e o senso comum dizem que, se alguém está contratando um empréstimo, é preciso ter certeza de que esse alguém realmente tem poderes para isso”.
A Americanas, que está em recuperação judicial, comunicou que as fraudes se davam por meio da chamada Verba de Propaganda Cooperada (VPC) — uma quantia negociada entre a indústria e o varejo e que serve, entre outras coisas, para cobrir eventuais custos com publicidade e propaganda. Além disso, a empresa admite a existência de operações de crédito e financiamentos que não foram contabilizados de forma adequada.
Matheus Falivene, que é Doutor em Direito pela USP, com especialização em Direito Penal Econômico pela Universidade de Coimbra (Portugal), explica o caminho para a implicação criminal. “O fato de admitirem que é uma fraude vai ter implicações criminais. Lógico que no âmbito criminal, incumbe à acusação, no caso o Ministério Público, comprovar que há um crime. Não basta a mera posição de sócio ou administrador para a responsabilização”.
Fenando Brandariz, advogado especializado em Direito Empresarial, Recuperação Judicial e presidente da Comissão de Direito Empresarial da OAB Pinheiros, lembra ainda que “a sociedade deverá ingressar com ações indenizatórias contra os ex-administradores e diretores, se ficar demonstrado dolo nas operações até então denominadas de fraudadas”.
Crimes de ordem econômica
Crimes de ordem econômica, em sentido amplo, incluem as condutas que prejudicam o desenvolvimento do livre mercado, a produção e circulação de bens e serviços e a livre concorrência. A previsão de crimes econômicos na legislação brasileira (Lei 8.137/90) visa coibir práticas que podem gerar vantagens desleais a determinada sociedade ou grupo societário que se beneficia da ilegalidade para aumentar os lucros e dominar o mercado.
De acordo com o comunicado ao mercado, apresentado pelo Conselho de Administração da Americanas, há envolvimento de Miguel Gutierrez, ex-presidente da Americanas que ficou no cargo por 20 anos e foi substituído por Sergio Rial em janeiro deste ano; Anna Christina Ramos Saicali, ex-presidente da Ame Digital; José Timótheo de Barros, ex-diretor responsável por lojas físicas; Márcio Cruz Meirelles, ex-diretor de plataformas digitais; Fábio da Silva Abrate, ex-diretor de relação com investidores da B2W e ex-diretor da Ame Digital; Flávia Carneiro, que atuava na controladoria da empresa; Marcelo da Silva Nunes, ex-diretor financeiro da B2W.
Afastados de suas funções em fevereiro deste ano, todos podem responder criminalmente, caso haja queixa crime feita pelo Ministério Público. O próximo passo é que a companhia e seus assessores apresentem às autoridades competentes relatórios detalhados das informações.
O atual presidente da empresa, Leonardo Coelho Pereira, participou de uma Comissão Parlamentar de Inquérito (CPI) na Câmara dos Deputados nesta terça-feira para tratar sobre o caso.