De acordo com a Organização Mundial da Saúde (OMS), uma em cada oito pessoas no mundo (970 milhões de pessoas) vive com um transtorno mental. No Brasil, estima-se que quatro em cada cinco pessoas (de 16 a 85 anos) tenham sofrido de um transtorno mental nos últimos 12 meses. Contudo, a compreensão e aceitação de doenças com caráter psicológico é escassa e, mesmo com recentes mudanças e investimentos, isso ainda vale para o ambiente corporativo.
Com o objetivo de desmistificar a saúde mental no trabalho, a Campanha Janeiro Branco foi criada em 2014 e tem ganhado mais destaque. A iniciativa busca conscientizar e auxiliar as equipes de Recursos Humanos (RH) a abordar o tema de maneira assertiva, aproveitando a sensação de início do ano – período marcado por promessas de novos hábitos e um sentimento de recomeço (páginas em branco).
As ações mais comuns endossadas pela campanha incluem palestras de sensibilização, grupos de escuta, comunicação acolhedora e a divulgação de programas de apoio psicológico com terapeutas. Ainda assim, para que os resultados sejam efetivos, é preciso que esse conceito seja abordado com a intensidade e as estratégias certas.
A realidade do trabalho administrativo
O cotidiano de profissionais em funções administrativas costuma envolver longas horas sentados em frente a telas, agendas apertadas e prazos rigorosos, que muitas vezes inibem até mesmo a ida ao banheiro. Para lidar com o sono e aumentar a produtividade, é comum recorrer ao consumo excessivo de café e guloseimas à tarde, acreditando erroneamente que o açúcar melhora o desempenho. Em casos mais extremos, alguns profissionais utilizam medicamentos que prometem “superpoderes produtivos”.
Relatos incluem trabalhadores que desenvolvem infecções urinárias por ignorarem necessidades fisiológicas ou que bebem pouca água por esquecerem de se hidratar. Ao final do dia, a sensação é de esgotamento. Muitos mal conseguem aproveitar o tempo fora do trabalho, optando por maratonar séries ou buscar alívio em substâncias tóxicas, como o álcool. 40% dos trabalhadores consomem álcool acima do recomendado.
Impactos a longo prazo
Essa rotina adoecedora não afeta apenas o corpo, mas também compromete a saúde mental. A pesquisa State Of The Global Workplace, da Gallup, apontou que 46% dos trabalhadores brasileiros sofrem de estresse diário, enquanto 25% lidam com tristeza e 18% com raiva diariamente. Os números devem ultrapassar a surpresa e serem levados a sério, de forma que seja removido o aspecto de normalidade sobre eles.
A boa notícia é que pequenas intervenções na rotina podem acabar com os detratores da saúde em ambiente de trabalho. Um estudo publicado no The American Journal of Psychiatry revelou que pequenas sessões de atividade física podem proteger contra o surgimento de depressão, sem contar o fator idade e região geográfica. A falta de movimento físico também está correlacionada ao aumento de doenças emocionais. Estudos recentes (Giugiu et al., 2024, NPJ Mental Health Research) sugerem que breves interrupções no comportamento sedentário podem levar a melhorias imediatas nos níveis de energia e humor.
A solução passa pela implementação de uma rotina de pausas, incluindo:
- Pausas cognitivas: realizar intervalos regulares para recuperação e reoxigenação cerebral, com base no princípio da hipofrontalidade transitória, para melhorar a clareza mental e reduzir o estresse cognitivo.
- Pausas de movimento: incorporar, além da paralização, momentos de movimento consciente durante a jornada de trabalho para aliviar tensões musculares, aumentar a frequência cardíaca, oxigenação cerebral e promover a liberação de hormônios do bem-estar.
- Hidratação adequada: garantir o consumo regular de água para manter o equilíbrio fisiológico e reduzir a fadiga.
- Lanches saudáveis: substituir café, doces e ultraprocessados por opções saudáveis, como frutas e nozes, que ajudam a manter os níveis de energia estáveis.
Benefícios das pausas
A adoção dessas práticas traz diversos benefícios, como a redução do estresse, melhora do humor, aumento da vitalidade, concentração e memória. Além disso, ajudam a prevenir transtornos de humor, compulsão alimentar e abuso de substâncias.
Promover uma cultura ocupacional centrada no movimento e no bem-estar é essencial para garantir um ambiente de trabalho mais saudável e sustentável. O sucesso de qualquer negócio depende diretamente da produtividade dos colaboradores que, por sua vez, vai de acordo com o bem-estar. Olhar para o tema é garantir um bom desempenho empresarial em todos os sentidos.
*por Daniel Sandy é educador físico especializado em Atividade Física Ocupacional, mestre em Ciência da Motricidade Humana, membro da Sedentary Behavior Research Network (SBRN) e do Prêmio Nacional de Qualidade de Vida da ABQV. Também é fundador da Pausa Ativa Ocupacional, única startup especializada em gestão de tempo sentado.