Quando se fala em falência, é comum que a sociedade associe o termo a um estigma negativo, afetando tanto os empresários quanto as empresas envolvidas no processo. Essa percepção muitas vezes impede o verdadeiro potencial de recomeço para aqueles que, por circunstâncias diversas, enfrentam dificuldades financeiras. No entanto, a legislação brasileira tem evoluído para mudar essa realidade e permitir que empreendedores superem este desafio, voltando ao mercado de forma renovada.
Há aqui uma inspiração no modelo do Chapter 11 dos Estados Unidos, instrumento da Justiça norte-americana usado para suspender a execução de dívidas e permitir que a empresa em dificuldades proponha um plano de reestruturação financeira e operacional. É nesse sentido que o Fresh Start, no Brasil, representa uma verdadeira revolução ainda pouco conhecida no nosso processo falimentar. Trata-se de um conceito que permite que o empresário se recupere mais rapidamente, com a extinção das suas obrigações após um período de três anos, ao invés dos cinco ou até dez anos exigidos anteriormente.
Um primeiro ponto importante é que a Lei de Falência e Recuperação de Empresas (Lei 11.101/2005) passou a contar com modificações pela Lei 14.112/2020, trouxe uma mudança significativa no inciso V do artigo 158. E a principal alteração foi o Fresh Start, que possibilita ao empresário, após três anos da decretação da falência, a reabilitação no mercado. Essa mudança acelera a recuperação e contribui para a reabertura de novas oportunidades de negócios.
O mecanismo não só beneficia o empresário falido, mas também traz benefícios para a economia como um todo. Ao permitir que o falido retorne ao mercado de forma mais célere, há um estímulo ao empreendedorismo, o que gera novas oportunidades de trabalho e movimenta a economia, sendo um importante fator de inovação e crescimento.
Além disso, a flexibilização do prazo para o retorno do empresário ao mercado também ajuda a evitar a perpetuação do estigma da falência, permitindo que o empreendedor continue a sua jornada de forma mais ágil e menos onerosa. A extinção das obrigações após três anos, ao invés de cinco ou dez, traz uma verdadeira mudança de paradigma, alinhando-se ao espírito de renovação e recuperação que a lei visa proporcionar.
Por fim, vale lembrar no que consiste o processo de falência para sabermos como buscarmos que ele ocorra com mais celeridade. Aqui falamos de um mecanismo jurídico que encerra as atividades da empresa, retira os poderes dos sócios (que se tornam falidos e inaptos a integrar o quadro social de qualquer empresa até acabar as obrigações dele sobre a falência) e que arrecada todos os ativos da empresa falida para posterior avaliação e venda. Logo, o produto dessa venda é revertido para o pagamento dos credores, que deve respeitar a ordem prevista nos artigos 83 e 84 da Lei 11.101/2005.
Antes da alteração da Lei 11.101/2005, pela Lei 14.112/2020, os processos de falência não tinham dispositivos legais que incentivassem o encerramento dos processos falimentares de forma célere, porque não havia prazo para a alienação dos ativos arrecadados e a desoneração do falido de suas obrigações estava vinculado ao término da falência.
Agora, a venda está, ao menos por força de Lei, obrigada a acontecer em até 180 dias após a arrecadação dos ativos e o falido fica desonerado das obrigações após 3 anos da decretação da falência (antes, precisava aguardar 5 anos após o encerramento da falência).
Desse modo, esses dois pontos são de grande relevância para acelerar o procedimento falimentar. Afinal, em tese, os empresários não ficam aguardando anos para a venda de ativos e, consequentemente, ter o dinheiro para dividir entre os credores; e o sócio da empresa perde a condição de falido em tempo definido.
Claro, nenhum empresário deseja entrar em recuperação judicial e, muito menos, ter sua falência decretada. Contudo, caso isto ocorra, é importante que recupere a possibilidade de empreender novamente, de forma organizada e sem carregar o estigma de falido eternamente.
Por Nathália Albuquerque Lacorte Borelli e Yuri Gallinari*