A obrigatoriedade das empresas de informar ao governo quanto ganham seus funcionários pode violar a Lei Geral de Proteção de Dados Pessoais (LGPD), dizem especialistas.
Para Carlos Eduardo Ambiel, sócio do Ambiel Advogados e professor de Direito e Processo do Trabalho da FAAP/SP, a preocupação fica por conta de alguns cargos que, de tão específicos, podem acabar sendo identificados. Ao tornar essa informação pública, isso violaria (ainda que a empresa mantenha o anonimato) a Lei Geral de Proteção de Dados Pessoais (LGPD).
“São algumas preocupações que surgem paralelamente a essa medida de transparência, porque acaba expondo também, de alguma forma, dados de empregados que conseguirão ser identificados porque a empresa só tem uma ou duas pessoas naquele cargo”, diz o especialista.
O preenchimento do relatório de transparência salarial, previsto em uma portaria do Ministério do Trabalho e Emprego (MTE) no final do ano passado, tem o objetivo de reparar a discriminação salarial entre homens e mulheres que ocupam o mesmo cargo.
Empresas privadas que tenham 100 ou mais empregados e sede, filial ou representação no Brasil terão que disponibilizar essas informações semestralmente em seus sites ou redes sociais.
Caso a companhia não publique o relatório, será obrigada a pagar multa administrativa de até 3% da folha de pagamento, com limite fixado em cem salários mínimos.
Washington Barbosa, mestre em Direito das Relações Sociais e Trabalhistas chama a atenção ainda para os casos em que, além da empresa, o próprio funcionário queira judicializar uma reclamação, caso ele venha a se sentir exposto com a divulgação das informações do relatório.
“É muito provável que o próprio empregado faça esse tipo de reclamação, principalmente porque esse é um direito individual, é uma garantia fundamental estabelecida na Constituição Federal. A própria lei (que determina o relatório de transparência) diz que isso deverá ser feito observando a LGPD. Então se eu vou ter de observar LGPD, esse é um tipo de situação que claramente vaza, que ultrapassa os requisitos e os cuidados da Lei Geral de Proteção de Dados”.
Ele também diz que se não quiser judicializar, um requerimento administrativo para o Ministério do Trabalho pode resolver a situação.
Barbosa diz ainda que, para evitar a multa pela não publicação, além da violação da LGPD em casos específicos, a empresa pode impetrar um mandado de segurança contra a lei que determina a disponibilidade de informações salariais, alegando o cumprimento da própria Lei Geral de Proteção de Dados.
Custos para as empresas
Caso sejam constatadas diferenças salariais, o primeiro custo, diz o professor Carlos Eduardo, será o de um aumento da folha de pagamento para adequar as desigualdades. Além disso, se a empresa não tiver um departamento de Recursos Humanos adequado, com pessoas suficientes para absorver o trabalho de fornecer as informações adicionais ao relatório, ainda pode surgir o custo de uma consultoria externa para ajudar na identificação e preparação desses dados.
O Ministério do Trabalho e Emprego (MTE) nega que haverá exposição de dados individuais. Paula Montagner, que é subsecretária de Estatísticas e Estudos do Trabalho do MTE, disse à CNN que os dados do relatório de igualdade salarial vão trabalhar as diferenças de salários, seja de salários de admissão ou de salários médios, por grandes grupos CBOs (Classificação Brasileira de Ocupações).
“Como nem todas essas diferenças são sem explicação, nós solicitamos informações adicionais às empresas para ver se ações ou políticas internas justificam essas diferenças que serão encontradas. Caso isso não explique tudo, elas ainda poderão ser melhor detalhadas nos planos de mitigação das diferenças salariais das próprias empresas”, explica a subsecretária.
Por Débora Oliveira/CNN