Nos últimos anos, o sonho de viver e trabalhar nos Estados Unidos tornou-se uma aspiração comum para muitos brasileiros. A promessa de uma vida melhor, oportunidades de trabalho e educação de qualidade tem atraído inúmeras pessoas em busca do famoso “sonho americano”.
No entanto, para alguns indivíduos, essa busca pelo tão desejado visto pode se transformar em um pesadelo, como no caso chocante de uma brasileira que foi vítima de uma suposta agência de intercâmbio.
De acordo com Daniel Toledo, advogado que atua na área do Direito Internacional, fundador da Toledo e Associados e sócio do LeeToledo PLLC, escritório de advocacia internacional com unidades no Brasil e nos Estados Unidos, tudo começou quando essa mulher, motivada por uma propaganda no Instagram, decidiu confiar em uma agência que prometia facilitar o processo de obtenção de visto, além de fornecer empregos nos Estados Unidos. “Mesmo afirmando que o objetivo era trabalhar no país, a suposta empresa deu entrada em um visto F1, voltado a estudantes, enquanto sua filha recebeu um visto F2”, revela.
O que parecia ser uma oportunidade, revelou-se como um esquema com diversas camadas. Ao chegar nos Estados Unidos, a brasileira foi colocada para trabalhar em uma empresa parceira da suposta agência de intercâmbio, onde recebia apenas 60 dólares por dia. “Ao entrar em contato comigo, ela afirmou que parte do seu salário era enviado diretamente da empresa em que ela trabalhava para a agência que realizou o processo de visto, afinal ela ainda devia aproximadamente 14 mil dólares por todo o procedimento. Isso mostra que as duas organizações trabalham em conjunto” declara Toledo.
A moradia da brasileira também foi providenciada pela agência em questão. “Ela vivia com a filha em um quarto dentro de um pequeno apartamento. O valor do aluguel, assim como as dívidas, era descontado de seu salário e repassado diretamente ao proprietário do imóvel”, relata.
Os problemas ficaram mais evidentes quando a filha dessa brasileira contraiu Covid-19 nos EUA. “Com apenas alguns dias recebendo cuidados médicos, a conta do hospital passou dos 6 mil dólares. A solução mais simples seria conseguir um segundo emprego para arcar com esses custos. No entanto, ao entrar em contato com a agência para comunicar esse fato, a mulher foi confrontada e ameaçada pelos porta-vozes da empresa”, revela o advogado.
Segundo Toledo, a agência em questão havia cadastrado seus próprios dados como patrocinadora dos estudos da brasileira enquanto ela ficasse no país. “A empresa passou a ameaçar que retiraria esse patrocínio, fazendo com que o visto fosse automaticamente cancelado e sua estadia nos EUA encerrada. A primeira reação foi, justamente, voltar ao Brasil para evitar maiores problemas”, declara.
Mesmo voltando ao seu país, as constantes ameaças foram o estopim para que a brasileira procurasse Toledo em busca de uma resolução. “Quando me deparei com esse caso fiquei espantado. Na minha visão, trata-se do tráfico de pessoas que são forçadas a trabalharem em condições análogas a escravidão. A agência realiza todo o processo de solicitação de visto na modalidade estudantil e, quando chegam ao país, esses indivíduos são obrigados a trabalharem em locais determinados pela própria empresa, recebendo apenas parte de seus salários”, lamenta.
O advogado acredita que esse tipo de prática é igualmente proporcional ao que fazem os famosos coiotes da fronteira mexicana. “A única diferença é que essa empresa proporciona um visto para a entrada legal. Mas ao chegar no país norte-americano o tratamento é exatamente o mesmo, onde os imigrantes são forçados a trabalhar para pagar uma eterna dívida”, pontua.
Para o especialista em Direito Internacional, esse acontecimento não pode passar despercebido. “Foi enviado um relatório ao Ministério Público mostrando tudo o que aconteceu nesse caso. Muito provavelmente, a Interpol será acionada e em breve deve haver uma resolução onde os responsáveis por esse tipo de prática sejam severamente punidos”, finaliza.