A guia Kirsty Whitman não precisou me dizer duas vezes. Olhando por minha máscara de snorkel na direção de seu dedo, vi uma enorme arraia-jamanta macho seguindo uma fêmea em perfeita sincronia – um esforço para impressionar uma parceira em potencial, exatamente como Whitman havia descrito durante sua apresentação animada na noite anterior.
Ter algum conhecimento do que estava acontecendo diante dos meus olhos em nosso safári de mergulho tornou o encontro ainda mais mágico enquanto eu lutava contra a corrente para admirar esse íntimo balé submarino por mais alguns preciosos segundos.
É um momento que eu poderia ter tido a sorte de vivenciar em qualquer lugar da Grande Barreira de Corais. Mas os avistamentos de arraias são ainda mais comuns nas águas azul-marinho que banham a ilha Lady Elliot, no remoto extremo sul do recife listado como patrimônio mundial, a cerca de 85 km a nordeste da cidade de Bundaberg.
A sua proximidade com a plataforma continental ajuda, mas estudos indicam que a regeneração da ilha provavelmente também desempenha um papel no fenômeno.
“Adoro que me digam que algo não pode ser feito”, disse Peter Gash, enquanto o diretor-gerente do resort Lady Elliot Island me levava até uma estrutura que lembrava um galinheiro gigante, com seu design ao ar livre permitindo a entrada da brisa marinha para resfriar naturalmente as 248 baterias internas.
Armazenando a energia captada por mais de 906 painéis solares, essa humilde central solar gera energia renovável suficiente para alimentar todo o resort. E isso inclui estações de dessalinização e tratamento de águas residuais individuais, bem como os alojamentos dos funcionários.
Quando a família Gash conseguiu arrendar a ilha de 45 hectares em 2005, a mudança para a energia solar era uma prioridade – não só por causa do meio ambiente, mas também das finanças. “Tínhamos três geradores que usavam de 550 a 600 litros de diesel por dia, e eles eram muito barulhentos”, disse Gash.
“Eu estava mergulhando com snorkel e ainda conseguia ouvi-los.”
Gash partiu em uma viagem pela Austrália para pesquisar usinas de energia solar. “As pessoas disseram que eu estava louco por tentar algo assim aqui, mas eu sabia que acharíamos um jeito”, ele sorriu.
O pai de dois filhos finalmente alcançou seu objetivo em 2020. Mas a jornada de energia renovável da ilha é apenas um capítulo de uma incrível história de turismo regenerativo com lições para o mundo.
Quase esgotada pelos mineradores de guano (acúmulo de fezes de aves e morcedos, usado como fertilizante) no final do século 19, e afetada por cabras soltas na ilha pelo governo de Queensland para garantir alimento aos marinheiros naufragados, Lady Elliot foi reduzida a pouco mais do que um campo de coral compactado em meados do século 20.
No entanto, o aviador Don Adams viu uma oportunidade de negócio quando aterrou na degradada ilha em 1969, abrindo um pequeno resort e iniciando um programa de recuperação.
Uma década depois, o jovem Peter Gash ficou igualmente apaixonado pela ilha – ou, para ser mais preciso, pelo seu potencial. Com uma licença de piloto de barco, Gash começou a transportar turistas de Brisbane e Gold Coast para Lady Elliot e Lady Musgrave, 40 km a noroeste, para explorarem a Grande Barreira de Corais sem a necessidade de viajar até o principal centro de turismo de recifes de Cairns.
Quando ficou impressionado com o contraste entre Lady Elliot e sua vizinha com vegetação densa, onde a mineração da era colonial havia sido menos intensa, uma semente foi plantada.
Gash estima que mais de 10 mil mudas nativas foram plantadas em toda a ilha.
Também graças a um programa contra plantas invasoras, Lady Elliot é uma ilha transformada, com cabanas de hóspedes agora protegidas dos ventos de nordeste por uma parede verde néon de arbustos e uma floresta de árvores que se erguem do lado oeste da ilha, oferecendo um lar para aves marinhas.
As árvores impedem o avanço de dunas frequentadas por tartarugas, e a equipe de Gash hoje estuda maneiras de reformar a pista de pouso da ilha com gramíneas nativas.
A recuperação da ilha, que agora abriga a segunda maior diversidade de espécies de aves na Grande Barreira de Corais, também está tendo um efeito positivo no recife circundante.
“Em altas concentrações, o fosfato e o nitrogênio no cocô dos pássaros podem matar o recife, mas é um pouco como o chocolate – se você tiver um pouquinho, está tudo bem”, explicou Gash.
Ao mergulhar, fiquei fascinado pela vitalidade da orla do recife de Lady Elliot. Circulando na base de um recife de coral, avistei uma tartaruga verde do tamanho de uma mesa de jantar cochilando.
Um par de peixes-papagaio – um indicador chave de um recife saudável – passou correndo, e cada anêmona parecia estar repleta de uma família robusta de peixes-palhaço.
Mas, como eu tinha percebido antes, essas águas azuis cintilantes, protegidas como uma “zona verde (proibida)” do parque nacional marinho, são mais conhecidas por suas majestosas arraias-jamantas.
Exposta no documentário sobre a Grande Barreira de Corais de David Attenborough, a população semi-residente de arraias aumenta para cerca de 700 indivíduos durante os meses de inverno, tornando a ilha um dos melhores lugares do mundo para nadar com essas pipas do mar.
Aqui os hóspedes não apenas admiram as jamantas, mas também ajudam a protegê-las participando do Projeto Jamanta. Organizada em colaboração com a Universidade de Queensland, a iniciativa permite que os turistas fotografem as jamantas que veem. Os dados são coletados e usados por pesquisadores.
É um dos poucos projetos de ciência cidadã em que os hóspedes podem se envolver durante a sua estadia na ilha, onde os visitantes também são incentivados a se somar à equipe no compromisso de proteger o ecossistema por meio de ações que incluem reduzir o uso de eletricidade e água.
Sem telefones, TVs ou wi-fi nas cabanas de hóspedes, os visitantes são convidados a se envolver com a ilha, com uma programação diária repleta de apresentações e experiências para se entrosar.
Fiquei intrigado com a Trilha das Mudanças Climáticas, e a ironia não passou despercebida quando descobri que a caminhada autoguiada – criada anos antes de a crise climática se tornar um tema crítico global – tinha sido quase inteiramente consumida pela vegetação regenerada.
Uma placa ainda visível destacando os impactos do aumento das temperaturas globais sobre o sexo dos filhotes de tartarugas marinhas é um testemunho da importância global da dedicação de Gash e sua equipe para minimizar a pegada de carbono da ilha, que também foi a primeira na Grande Barreira de Corais a proibir garrafas plásticas descartáveis, em 2012.
Seus esforços não passaram despercebidos. Gash foi premiado com a Medalha da Ordem da Austrália em 2020 por seus serviços ao ecoturismo e à aviação. Lady Elliot também atraiu alguns dos maiores nomes mundiais da conservação ao longo dos anos, incluindo o rei (então príncipe) Charles, que a visitou em 2018.
No mesmo ano, Lady Elliot foi selecionada como a primeira “arca das mudanças climáticas” a ser estabelecida pela Iniciativa das Ilhas de Corais da Fundação da Grande Barreira de Corais, um projeto de dez anos para estabelecer uma rede de refúgios e proteger habitats críticos nas principais ilhas de recifes.
Nada é desperdiçado em Lady Elliot. O lixo é cuidadosamente separado, os restos de comida são transformados em composto por uma máquina carinhosamente conhecida como Oscar, e as águas residuais tratadas são usadas para irrigação.
No entanto, os hóspedes não ficam sem drinques, servidos na traseira de um buggy elétrico em Lighthouse Beach todas as noites ao pôr do sol.
Como a frota de aviões pequenos que transporta os hóspedes é responsável pela maior parte das emissões do resort, Gash agora busca aderir à aviação elétrica.
“Eu esperava voar em um avião elétrico para Lady Elliot no meu aniversário de 65 anos, mas, faltando apenas um ano, talvez seja no meu aniversário de 70 anos”, ele sorriu, com um brilho nos olhos.
Por Sarah Reid/BBC Travel