Apelidada de “Rainha do Brasil”, e eleita pela ONU como o alimento do século XXI, a mandioca tem tudo para não descer do salto e perder a majestade para o trigo. É o que acredita a Nuu, startup mineira de alimentos regenerativos à base desta raiz, que se consagrou no mercado a partir do resgate da receita ancestral brasileira do pão de queijo.
“A base do pão de queijo é a mandioca e fomos nos apaixonando por ela no decorrer do tempo. Investigamos e descobrimos que ela substitui completamente o trigo. Está na culinária indígena, é eclética, presente em todas as classes sociais, dialoga com a cultura gastronômica brasileira, é uma matéria-prima nativa do nosso bioma, e oferece muitas possibilidades para explorar”, diz Rafaela Gontijo, CEO da Nuu.
Além das vantagens listadas por Rafaela, a mandioca vai além: é de cultivo generoso, pois usa com parcimônia os recursos hídricos, os nutrientes do solo, e é resistente a períodos de seca. A Nuu considera ainda que ela tem o benefício de ser local, o que emite menos carbono na produção.
“Atualmente utilizamos a mandioca do Paraná, mas queremos migrar para a Amazônia, de onde ela surgiu, e beneficiar a população local, aprender com seus saberes, algo que a indústria não acessa. Queremos voltar à nossa origem”, explica a executiva.
PÃO DE QUEIJO DA VOVÓ
Esta volta às raízes é um dos pilares da Nuu, empresa que se define como aquela que “faz comida de antigamente pensando nas gerações do futuro”.
Tudo começou quando Rafaela, mineira convicta, filha de fazendeiros, e então executiva da Johnson & Johnson, percebeu que a receita de pão de queijo estava se perdendo, e se transformando em algo completamente diferente. Decidiu, então, deixar a carreira na empresa e empreender na cozinha de casa, preparando a receita tradicional feita nas fazendas desde o século XVIII, e vendendo o produto nas feiras locais.
“Essa nova geração não conhece muito isso de comida de vovó, até porque porque hoje em dia muitas avós trabalham e não cozinham. Notei que o pão de queijo original brasileiro estava se perdendo. Ao começar com a Nuu, tivemos que batalhar, por exemplo, pela certificação, pois o segredo é usar queijo cru. Já o uso de banha de porco, como manda a tradição, não conseguimos emplacar”.
Mesmo sem a banha, a Nuu é hoje uma empresa que utiliza, em quatro linhas de produtos, ingredientes naturais e minimamente processados. Sem glúten, sem corante, sem aromatizante – e sem pressa, como dizem. No pão de queijo, por exemplo, vai queijo curado, polvilho doce, leite, ovos, água, polvilho azedo, manteiga e sal. Só. Agora tem uns mais moderninhos, coloridos, com suco de beterraba ou de cenoura.
“Nosso objetivo é crescer assim, com a essência viva. Mas dá trabalho e é preciso conscientizar o consumidor que ele não está comprando algo padronizado. Um chocolate Bis, por exemplo, tem o mesmo gosto aqui e no Japão. Já o queijo fresco, os ovos, a fermentação, a cor do suco natural da cenoura, tudo isso vai variar. O consumidor compra achando que tudo vai ser sempre igual – e o produto terá um aspecto e sabor diferentes a cada compra. Esta é uma grande batalha”.
SUSTENTABILIDADE
A Nuu aposta também na sustentabilidade desde o início de suas operações. A fábrica foi construída em 2019 e foi uma das primeiras no Brasil a serem consideradas carbono zero. Utiliza energia limpa e renovável, aproveita a água da chuva, faz o tratamento de efluentes, e leva a economia circular a sério. “Nossa responsabilidade vai até a ração de se dá para o gado que vai fornecer o leite para nosso queijo”, explica Rafaela.
A empresa é liderada por mulheres, além de integrar o movimento Capitalismo Consciente, trazer a pegada de carbono em suas embalagens, e carregar certificações como o Eu Reciclo, Women Owned, SVB e B Corp. Foi ainda premiada pela ONU, entrando para a seleção das 50 empresas do mundo a terem o título “UN Best Small Business: Good For All”.
“A Nuu não vende apenas alimentos, ela é um instrumento de transformação – a partir das nossas práticas queremos ganhar visibilidade e incomodar as grandes marcas que fazem a economia girar. Queremos dialogar com quem atua de fato na Amazônia e nos nossos biomas”.
Por Mariana Sgarioni/NetZero