“Não é que as pessoas maduras se sintam insatisfeitas com o mercado de consumo; elas se sentem invisíveis, algo muito mais profundo”.
A afirmação é de Cristián Sepúlveda, especialista no mercado da longevidade pela FGV e cofundador, com Marcos Eduardo Ferreira, da Silver Hub.
A aceleradora é a primeira do Brasil com foco em agetchs, startups com soluções tecnológicas para resolver os desafios e desejos dos mais maduros. Em 2020, um estudo da Fundação Dom Cabral calculou que existam 300 empresas com foco em longevidade no Brasil, mas Cristián acredita que hoje esse número já esteja em 500.
Geralmente, as ofertas para a população 60+ — que deve chegar globalmente a 1,4 bilhão de pessoas até 2030 — se concentram no setor de saúde, pois é comum associar o envelhecimento a doenças. Mas essa ideia já está bem ultrapassada, segundo Cristián.
Como estão vivendo mais, os seniores procuram se manter ativos e produtivos, seja trabalhando (por vontade própria ou necessidade), estudando, viajando, fazendo novas amizades etc.
Para atender essas necessidades e melhorar a qualidade de vida e bem-estar de quem está envelhecendo, a Silver Hub, fundada em 2022, aposta em alavancar negócios com foco na Economia Prateada, que movimenta 2 trilhões de reais por ano no país (20% do PIB), segundo a consultoria Data8.
Desde o início da operação, oito agetechs passaram pela aceleradora, que nos próximos três anos tem a pretensão de acelerar 20 startups early stage, com investimentos de cerca de 200 mil reais em cada.
ELES DECIDIRAM EMPREENDER JUNTOS QUANDO SE CONHECERAM EM UMA ESPECIALIZAÇÃO SOBRE LONGEVIDADE
Cristián, 48, é chileno, mas vive no Brasil há mais de uma década. Executivo por 25 anos, ele teve passagem por empresas como Telefónica e Atento (como CFO, foi transferido para o Brasil).
Depois, em 2017, mergulhou no mundo da startup e da inovação, cofundando a Genoa Performance, com foco em CRM para call centers de empresas. O negócio foi vendido, mas lá ele teve contato com uma empresa de home care, uma das clientes da startup, e começou a se interessar pelo tema da longevidade.
“Foi minha primeira aproximação com esse mercado e com o que estava acontecendo em relação ao envelhecimento da população. Vi também que alguns fundos de private equity estavam comprando empresas de home care no Brasil e no mundo e percebi que nesta área havia oportunidades interessantes”
Ele decidiu, então, fazer uma especialização sobre longevidade. Marcos também buscou se atualizar na academia sobre tema, do qual já era próximo por ter atuado durante mais de 30 anos como CEO da Mapfre Seguros. Nos últimos quatro em que esteve na seguradora, assumiu a posição de CEO Regional LATAM SUR e foi transferido para a Bolívia.
“Nos últimos dois anos da minha atuação na empresa, minha mulher já não estava tão contente de viver na ponte aérea entre Bogotá e São Paulo, e passamos a repensar um pouco o que a gente ia fazer da vida”, diz.
“Então, comecei a me preparar para um período sabático e, em 2020, tomei a decisão de antecipar minha aposentadoria e empreender com algo na área da longevidade”
E foi na sala de aula, onde se conheceram e passaram a analisar as oportunidades do mercado, que os dois cofundadores decidiram juntar suas experiências e empreender a Silver Hub, investindo 300 mil reais para dar início ao negócio.
A ACELERADORA OFERECE MENTORIA, INVESTIMENTO E CONEXÕES AOS EMPREENDEDORES QUE APOSTAM NOS MADUROS
Durante o curso, de acordo com Marcos, dois principais fatores chamaram atenção da dupla em relação ao mercado da longevidade e fizeram com que os sócios batessem o martelo na ideia da aceleradora de agetchs.
O primeiro foi o volume de recursos movimentados pela Economia Prateada e o segundo, a falta de representatividade nos produtos e serviços disponíveis – e nas campanhas publicitárias para esse público.
“Parecia que havia aí uma demanda reprimida. Os maduros estão vivendo mais, com mais qualidade de vida e — com uma renda média acima da dos demais trabalhadores –, mas não conseguindo comprar algo desenhado e pensados para eles por falta de oferta de produtos e serviços ou do erro das empresas em se comunicarem com esse público”
Para que as startups em estágio inicial aproveitem essa oportunidade e não cometam os mesmos erros dos negócios que já estão no mercado, negligenciando esses consumidores, a Silver Hub desenvolveu sua própria metodologia.
A aceleração dura entre quatro e cinco meses, com foco nas seguintes trilhas: planejamento estratégico; financiamento; precificação; modelagem de negócios; desenvolvimento de habilidades e liderança; avaliação de equipe; pitch; marketing e comunicação; e vendas.
Depois do processo, a aceleradora ainda acompanha os negócios para saber como estão os resultados do ponto de vista comercial e ajudá-los na aproximação com fundos de investimentos, venture capital etc. A própria Silver Hub realiza investimentos-anjos, com valores entre 200 e 300 mil reais.
Outro pilar muito importante, destaca Cristián, é o desenvolvimento de networking. Para isso, a aceleradora conta com mais de 16 especialistas que apoiam as startups com mentoria – e eventualmente, investimento — mas principalmente com smart money, oferecendo suas redes de relacionamento com potenciais clientes.
“Esses associados ajudam a abrir as portas do mercado para essas startups com suas conexões e experiências. Especialmente, nesse momento que temos uma escassez de capital, a experiência e relacionamento são fatores decisivos no êxito de uma startup”
No time de especialistas associados há nomes como o de Alex Körner, Andrea Milan e Patricia Siequeroli.
DENTRE AS SOLUÇÕES ACELERADAS PELA SILVER HUB HÁ DESDE STARTUPS DE PREVENÇÃO DE QUEDAS A DE PLANEJAMENTO SUCESSÓRIO
A Techbalance, que já foi pauta no Draft, é uma das startups aceleradas pela Silver Hub. Fundada pela fisioterapeuta Fabiana Almeida, a plataforma usa tecnologia para ajudar a identificar riscos músculos-esqueléticos e a prevenir quedas.
Cristián afirma que ainda não é possível mensurar os impactos da aceleração na prospecção de novos clientes para os negócios apoiados, já que a maioria trabalha no modelo B2B, “com contratos que demoram de 12 a 14 meses para serem fechados”.
No entanto, ele diz que a Silver Hub ajudou a TechBalance a captar investimentos.
“A própria aceleradora investiu 250 mil reais na TechBalance e ajudamos a conectar a startup com investidores do Chile”
Quem também recebeu um aporte da aceleradora, no mesmo valor, foi a Truvio, plataforma tecnológica de medicina preventiva, gestão e monitoramento de pacientes crônicos.
Outros exemplos de negócios apoiados são a Misyu, plataforma de planejamento sucessório criada por Mário Cássio perfilada aqui quando ainda se chamava Meu Último Desejo, e a Vida60mais, marketplace de produtos e serviços para os maduros, que também já apareceu no Draft. Depois de passar pela aceleração, a fundadora, Arine Rodrigues, acabou se tornando sócia da Silver Hub.
O modelo de negócio é de investimento de risco, com equity, ou seja, participação acionária nas startups. “O percentual depende um pouco de cada empresa, do seu potencial e momento, mas varia 4% a 8%”, diz Cristián.
A aceleradora não realiza uma chamada específica, portanto startups interessadas no programa podem se inscrever a qualquer momento pelo site da Silver Hub.
A META É ACELERAR A ECONOMIA PRATEADA NÃO SÓ NO BRASIL, MAS EM TODA A AMÉRICA LATINA
Apesar ou justamente por ainda existirem poucas agetechs, os cofundadores sabem que essa área representa um oceano azul ou “prateado”, como gosta de chamar Cristián:
“Precisamos de mais empreendedores interessados em resolver os problemas dos maduros. Ainda é um mercado que está em desenvolvimento. Um dos nossos objetivos é ajudar a acelera-lo tanto no Brasil como na América Latina”
Para alcançar esses novos horizontes, a Silver Hub está apoiando uma startup uruguaia, a Pills & Care e, recentemente, no final de agosto, realizou um evento sobre longevidade com foco na América Latina.
O Inova Silver aconteceu no dia 30 de agosto em São Paulo e contou com o apoio do projeto “Pensar en Grande” do BID LAB e da Endeavor Uruguai. O encontro buscou conectar especialistas, investidores e startups para impulsionar a economia da longevidade.
“A gente vê que muitas empresas ainda estão bastante devagar nessa mudança de mentalidade em relação ao envelhecimento”, diz Cristián. “Então, a ideia do evento era também aproximar essas companhias do tema para que comecem a mudar essa percepção.”
E isso precisa mesmo mudar logo, não só pelas oportunidades comerciais, mas porque cada vez mais os maduros representarão uma grande fatia da população. A previsão é de que em 2050 eles sejam 30% dos brasileiros e que 50% das crianças que hoje têm apenas 5 anos tornem-se centenárias. Com essas perspectivas, toda a sociedade precisa estar preparada já para essa transformação que se dará em curto prazo.
DRAFT CARD
- Projeto: Silver Hub
- O que faz: Aceleradora de agetechs
- Sócio(s): Cristián Sepúveda, Marcos Eduardo Ferreira e Arine Rodrigues
- Funcionários: 4 (com os fundadores)
- Sede: São Paulo
- Início das atividades: 2022
- Investimento inicial: R$ 300 mil (aprox.)
- Contato: [email protected]
Por Dani Rosolen